sábado, 29 de agosto de 2009

Texto encenação "Retratinho de Gil Vicente"

Alguns biógrafos afirmam que Gil Vicente terá nascido por volta de 1460. Uns dizem que o autor do “Auto da India” e do “Auto da Visitação” (que hoje apresentaremos aqui também), nasceu em Guimarães. Outros dizem que nasceu em Barcelos. Há quem defenda que o autor Gil Vicente era o mesmo que o ourives Gil Vicente, a quem D. Manuel I confiou a execução da célebre Custódia de Belém. Uns defendem teorias completamente diferentes. Mas a História, é sempre a História possível. E nós decidimos seguir o rasto das várias teorias. A meio, baralhámos tudo. Baralhámo-nos também. Mas, assim, foi muito mais divertido.

Gil Vicente não é o “pai do teatro português”. Acredito, seriamente, que ele tenha sido um dos seus “amantes” mais dedicados. Efectivamente, são de Gil Vicente alguns dos primeiros exemplos daquilo a que podemos chamar literatura dramática em Portugal. No entanto, o teatro deve ser entendido como uma totalidade, composta pelo conjunto dos elementos que fazem o espectáculo - o gesto, as palavras, o cenário e o ritmo - e em que o texto (a literatura) representa o elemento central desse “corpo” que é o espectáculo teatral. Assim, não devemos fazer da história do teatro um mero capítulo da história da literatura. Antes de Gil Vicente, já existia teatro em Portugal. Mas, também isso, não nos interessa muito.

Interessou-nos explorar esta ideia do “duplo”, do desdobramento, jogando o jogo do teatro, da transformação, do travestimento - recusando os grandes artifícios -, dobrando Gil Vicente em ourives e autor de teatro, multiplicando-o em muitas personagens/ máscaras. Pelo meio, ficámos baralhados. Partíamos de uma situação de equilíbrio (tentando seguir uma teoria, uma linha narrativa direitinha), para, logo a seguir, desequilibrarmos tudo, baralharmos as peças do tabuleiro e estilhaçarmos todas as máscaras (“Terá sido Gil?”). No fim, quem nos devolveu o equilíbrio, com o seu primeiro texto, apresentado nos aposentos da Raínha D. Maria, por altura do nascimento de D. João III, foi o próprio Gil Vicente, autor de teatro... Ou talvez não...

Pedro Alves, encenador

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